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Claro como a água

Um blog para os apaixonados por livros, ou simplesmente para quem procura um livro para ler

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OPINIÃO | Coração tão Branco

12.04.16

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Título: Coração tão Branco

Autor: Javier Marías

Ano de publicação: 2013

Editora: Alfaguara

 

Coração tão Branco foi a minha estreia com Javier Marías. Começa assim:

 

"Eu não quis saber, mas soube que uma das meninas, quando já não era menina e não fazia muito voltara de sua viagem de lua-de-mel, entrou no banheiro, pôs-se diante do espelho, abriu a blusa, tirou o sutiã e procurou o coração com a ponta da pistola do próprio pai, que estava na sala de almoço com parte da família e três convidados. Quando se ouviu a detonação, uns cinco minutos depois da menina ter abandonado a mesa, o pai não se levantou de imediato, mas ficou alguns segundos paralisado com a boca cheia, sem se atrever a mastigar nem a engolir nem, menos ainda, a devolver o bocado ao prato; quando por fim se levantou e correu para o banheiro, os que o seguiram viram como, enquanto descobria o corpo ensanguentado da filha e levava as mãos à cabeça, ia passando o bocado de carne de um lado ao outro da boca, sem saber ainda o que fazer com ele."

 

Javier María brinca com as palavras e constrói um puzzle em forma de livro. Acredito que qualquer frase escrita por Javier se torne agradável aos olhos dos seus leitores, ainda que possa soar uma barbaridade (pelo menos comigo foi assim). Não sei se é característico do autor ou da obra mas encontrei em Coração tão Branco  uma sensibilidade inesperada da qual foi impossível sair indiferente.

 

Embora o vocabulário utilizado por Javier seja simples, a sua escrita não é nada trivial, utiliza constantemente frases e parágrafos intermináveis, cheios de detalhes e muitos momentos de divagação. Parece-me que este foi o principal entrave a uma leitura mais fluida e constante. 

  

Toda a obra gira em torno de temas como o casamento, a importância dos segredos e o poder das palavras (as ditas e as desejadas). Aqui fica um excerto que engloba todas essas temáticas:

 

"Podemos calar-nos e calar-nos para sempre, mas convencemo-nos de que amamos mais porque contamos segredos, tantas vezes contar parece uma prenda que se dá, a maior prenda que se pode dar, a maior prova de lealdade, de amor e de entrega. E esforçamo-nos por contar. De repente, não nos contentamos em dizer palavras ardentes que se esgotam rapidamente ou se tornam repetitivas. E tão-pouco se contenta quem as escuta."

 

Nesta história temos duas personagens importantes: Teresa, a rapariga do primeiro parágrafo, que se mata com um tiro no coração; e Juan, o narrador que nos vai contando a sua história e os seus receios de jovem recém-casado. Não quero alargar-me neste campo, acho no entanto que é importante não iludir ninguém por isso aqui vai: não achei a história particularmente interessante, nesse aspecto esperava um bocadinho mais. Talvez as minhas expectativas fossem demasiado elevadas e por isso me tenha decepcionado um pouco com o rumo da história, ainda assim foi uma leitura espectacular!

 

Este não é um livro para todo o tipo de leitores muito menos é um livro sobre o qual devemos escrever, é sim um livro para se ler com calma e para se desfrutar cada palavra do início ao fim.

 

Sinto-me mais rica depois de ter lido Javier Marías (e feliz por ter Os Enamoramentos na estante). Este pode bem ser a revelação de 2016 no meu mundo literário. Leiam!

 

Classificação no Goodreads: 5/5